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Para além do Bolsonarismo

Quando começo a escrever essas linhas, o julgamento da inelegibilidade de Bolsonaro está prestes a se concluir no TSE, seja qual for o resultado, só o fato de Bolsonaro ir a esse julgamento absurdo,  por puro voluntarismo dos ministros, já é um sinal inequívoco da derrocada da democracia brasileira.

Bolsonaro foi eleito como um candidato anti-establishment, cristalizando os anseios da população que saiu em massas às ruas em 2015, e nos anos subsequentes. Petrolão e o início das delações premiadas, além de uma desconfiança severa do nosso processo eleitoral, e o impeachment da Dilma foram os principais combustíveis daquele movimento. Fato é que o governo Bolsonaro, apesar de muito promissor no início, foi envolvido rapidamente pelo seu entorno mais liberal e pragmático, a famosa turminha do “deixa isso”, e o deputado aguerrido rapidamente foi dando lugar a um presidente conciliador.

O sistema que não brinca em serviço, resolveu testá-lo já no início, através de Alexandre de Moraes, que pisando a lei do país, e abusando se sua prerrogativa de ministro do STF, proibiu Bolsonaro de indicar Ramagem para a chefia da Polícia Federal. Não sei porque Bolsonaro simplesmente não deu de ombros para o pedido estapafúrdio e ilegal do ministro, e não seguiu em frente na nomeação do seu escolhido. Infelizmente, talvez ouvindo algum mau conselho, se dobrou à sanha de Moraes. Este evento pareceu ter sido um balão de ensaio. Daí para a frente, o que se viu só foi um descer de ladeira e alguns recuos que sempre encontraram respaldo no briefing amigo, como se tudo fizesse parte de uma importante ação estratégica, um xadrez 4D. Fato é que a corda que estava esticada, jamais estourou, e até hoje há quem fique aguardando a esperada bala de prata que nunca veio.

Mas nem tudo é lamento. Se o governo Bolsonaro se mostrou muito aquém, e muito mais fraco e tímido do que esperávamos, pelo menos ele serviu como um vírus, que revelou toda a pujança, capilaridade e malícia do sistema na sua reação. Todas as vísceras do establishment foram expostas durante os quatro anos do governo Bolsonaro. A começar pelo ativismo judicial insaciável do STF e de Moraes, a infiltração ideológica no Ministério Público e Judiciário, a fraqueza dos chefes das duas casas legislativas, a parcialidade absurda da imprensa e aquilo que podemos dizer que foi o mais surpreendente e vergonhoso, a omissão das Forças Armadas que deram às costas para o povo e nação quando estes mais precisaram.

Não existe um regime são no Brasil. Esse conluio entre STF e PT nos ofende diuturnamente. Um descondenado ficha suja que foi liberado para concorrer à Presidência da República, e venceu a eleição num processo eleitoral para lá de suspeito, é algo difícil de digerir. O professor Olavo de Carvalho já dizia que uma eleição com apuração secreta de votos (e eu acrescento, sem a possibilidade de recontagem física dos votos) não precisa ter fraudes pontuais para ser fraudulenta, já o é na sua essência, porque fere um dos princípios mais elementares da democracia que é a  transparência.

Bolsonaro errou a mão ao insistir tanto no mantra das quatro linhas sem encontrar uma saída prática para a sinuca de bico no qual ele e o país se encontravam. Infelizmente, a Constituição brasileira não previu a ditadura de toga que tomou conta do Brasil. Se aqueles que tomaram de fato o poder no Brasil, são os mesmos que tem a prerrogativa de interpretar a Constituição a seu bel-prazer, estamos no pior dos mundos, e parece que precisaremos olhar para além dela, para começar a sair do atual atoleiro. A consolidação da ditatoga e os abusos reiterados e sem punição de Alexandre de Moraes são as provas cabais da falência do atual regime.

A lei e o direito naturais e a doutrina social da Igreja certamente terão uma saída para o buraco positivista-fluido (basta ver as interpretações criativas dos ministros do STF) no qual nos encontramos atualmente, e eles precisam inspirar realmente uma futura Carta Magna, no caso de se permanecer num regime Constitucional, para a que a justiça, a ordem, a moralidade e a legalidade voltem a ter lugar em nosso país.

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